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Coronel Sérgio Mário Pasquali

por italo publicado 24/08/2011 15h07, última modificação 24/08/2011 15h07
Ex-ministro da Educação diz que o Projeto Rondon continua ajudando a integrar o Brasil

Francisco Dandão

Provavelmente ninguém neste país seja mais apaixonado pelas ações do Projeto Rondon do que o coronel Sérgio Mário Pasquali, ex-secretário geral e ex-titular do Ministério da Educação no Governo do general João Batista Figueiredo. Tanto que aos 85 anos de vida, idade em que a maioria das pessoas prefere permanecer ociosamente recolhida aos confortos do lar, desfrutando de merecidas aposentadorias, ele usa o seu tempo para viagens pelo Brasil, onde fiscaliza a quantas anda a idéia que ajudou a criar nos idos anos de 1965, quando ministrava aulas para a formação de militares que, posteriormente, exerceriam postos de comando nos diversos quartéis brasileiros.

De passagem pelo Acre na primeira semana de agosto, onde se reuniu com antigos e novos “rondonistas”, o coronel Pasquali, gaúcho da cidade de Guaporé (RS), concordou em conversar comigo durante alguns minutos. O resumo dessa conversa, em forma de entrevista, é o objeto do texto que vem a seguir.

 

Eu gostaria que o senhor falasse um pouco da sua vida...

Mário Pasquali - Eu nasci numa colônia italiana, no Rio Grande do Sul. Meus avós eram italianos e, realmente, saí de lá para estudar em Porto Alegre. Fui para a academia militar e segui nessa carreira, onde eu fiquei até me reformar, há muitos anos atrás. Servi em vários lugares deste país. E eu acho que em consequência disso adquiri um pouco de conhecimento das várias realidades que integram esse país continental e multirracial. Eu acho que a nossa profissão nos dá essa oportunidade. Às vezes, numa profissão civil, um médico se forma e vai até o fim da vida na mesma cidade em que se formou, sem conhecer os outros brasis. E nós temos vários e diferentes brasis. A nossa profissão militar nos tira de lá. A minha filha mais velha nasceu no pantanal do Mato Grosso, outra filha nasceu no Rio de Janeiro, a minha senhora é carioca... Enfim, a nossa profissão nos proporciona um conhecimento das realidades brasileiras e nos dá consciência dos problemas desse país.

 

Agora eu queria que o senhor falasse sobre o seu período no Ministério da Educação, no governo João Figueiredo. Especificamente, gostaria que o senhor falasse quais foram as maiores dificuldades e o que o senhor destacaria como principais realizações do período.

Mário Pasquali - Olha, eu passei cinco anos no Ministério da Educação. Eu fui para o ministério na função de secretário-geral e exerci a função de ministro durante pouco mais de um ano. Substitui no cargo o Rubem Ludwig, que foi designado para a Casa Militar. Mas a minha ação maior no Ministério da Educação foi como secretário-geral. Eu passei do Projeto Rondon para a secretaria geral do Ministério da Educação. Então, eu estava imbuído da problemática social desse país continental. E, realmente, eu procurei fazer alguma coisa no sentido de somar com aquelas realizações que nós vínhamos procurando desenvolver nas áreas mais carentes, estimulando a criação de universidades nos pontos mais avançados. Eu me voltei muito nesse meu período no Ministério da Educação para a problemática da Amazônia, que eu tinha absorvido em função da minha atividade no Projeto Rondon e da implantação dos campi avançados das universidades do sul do país na região amazônica. E me envolvi muito também no problema do ensino do primeiro grau, que foi objeto do nosso esforço maior no ministério, porque nós entendíamos que não adiantaria criarmos grandes universidades se a nossa população ao atingir a idade escolar não tivesse oportunidade de entrar para uma escola, se alfabetizar e terminar o segundo grau.

 

E quanto ao Projeto Rondon, coronel, como é que surgiu essa idéia?

Mário Pasquali - A idéia do Projeto Rondon surgiu em meados dos anos de 1960, oportunidade em que eu era instrutor da Escola de Comando do Estado Maior do Exército e me cabia, além das minhas matérias militares, fazer a ligação com um professor civil que dava aulas de sociologia. Você pode estranhar a Escola de Comando do Estado Maior do Exército ter um professor de sociologia, mas quando se faz uma escola para preparar os futuros generais, é preciso que eles tenham uma idéia da sociedade que eles vão defender. Então, matérias como sociologia eram dadas no curso, para que eles conhecessem bem o ambiente social brasileiro. E esse professor de sociologia acabou ficando muito meu amigo e, no final do curso, ele sugeriu que os alunos se organizassem em grupos e que se trouxessem professores de sociologia de fora para discutir com os alunos. Entendia-se que esse debate seria essencial para que os alunos entendessem melhor a sociedade. E, na reunião preparatória para o debate, um dos professores convidados, sabedor da diversidade das regiões as quais os diversos oficiais-alunos eram oriundos, acabou verbalizando o entendimento de que aquelas pessoas tinham um melhor conhecimento do Brasil. O professor disse então que aqueles alunos eram mais brasileiros, por força da profissão e que era preciso que se levasse o estudante universitário brasileiro, particularmente os das grandes capitais, a conhecerem esse Brasil imenso e diversificado. O professor Wilson Schoeri, que estava ao meu lado, e era vice-reitor da universidade do então Estado da Guanabara, entendeu então que era preciso levar o estudante universitário jovem para ter a mesma oportunidade que os militares tinham de conhecer o país, por força da profissão. Terminada a reunião, eu levei ao general João Pina Machado, que era o comandante da escola, a idéia do professor Schoeri. O general Pina mandou que a gente colocasse o Schoeri na V3, que era uma viagem que se fazia no fim do terceiro ano do curso, como decorrência do estudo de uma região do país. Naquele ano se estudou a problemática da Amazônia, sob todos os aspectos. O Schoeri foi na viagem e, ao voltar, pediu para falar com o general Pina, afirmando-lhe que era preciso levar a juventude universitária para conhecer o Brasil. O general então me designou para ver como a gente poderia ajudar o Schoeri nessa idéia dele. Daí, o Schoeri imaginou levar estudantes das universidades do Rio de Janeiro numa viagem-piloto, que nós chamamos de Operação Zero. Eu fiquei encarregado de fazer a ligação com o coronel Weber, que foi quem levou o 5º BEC para Rondônia, com o intuito de construir uma nova rodovia e erradicar a estrada de ferro Madeira Mamoré. O Schoeri foi quem teve a idéia de chamar a viagem de Operação Rondon, em homenagem ao coronel que foi para a citada região com a missão de demarcar fronteiras, mas entrou na problemática dos índios, criando posteriormente a Funai. E foi aí, portanto, que começou o Projeto Rondon, com a chamada Operação Zero, que foi realizada em Porto Velho, espalhando estudantes por toda a região.

 

Sobre as duas fases do Projeto Rondon, primeiramente de responsabilidade do governo e depois por iniciativa da sociedade civil, explique, por favor, os motivos desses dois momentos.

Mário Pasquali - O Projeto Rondon foi extinto como órgão público no governo Sarney, em 1989. Ele era vinculado ao Ministério do Interior. O Sarney extinguiu mais de trinta órgãos, entre os quais o Projeto Rondon. Ele extinguiu como órgão público, mas nós nos reunimos, porque o Rondon já estava implantado, já tinha o espírito do pessoal, e prosseguimos a atuação dentro das possibilidades, em cada Estado. Criamos, então, uma Oscip [Organização Social de Interesse Público], registramos, inclusive, a marca [três setas em sentidos diferentes dentro de um mapa do Brasil], bem como a frase “integrar para não entregar”, que nasceu na Operação Zero. O Projeto Rondon é hoje uma organização social de interesse público, registrado no Ministério da Justiça. O slogan, explique-se, era uma espécie de reação àquele projeto internacional do escritor americano Herman Khan, que havia desenvolvido uma tese para utilizar a Amazônia para trazer os deslocados da Europa etc. Havia uma série de opiniões, até de líderes europeus com esse fim, num período não necessariamente logo o após guerra, com a Europa com muitas populações deslocadas... E a Amazônia era um grande vazio demográfico... Então, a garotada que voltou com esse slogan “integrar para não entregar”, voltou vibrando, o que resultou na expansão do projeto e o que, acredito eu, nos deu forças para, após ser extinto como órgão público, continuá-lo como Oscip. E eu diria até que o Projeto Rondon está em pleno processo de crescimento. Nós já estamos atuando nos países vizinhos. Nós já estamos atuando em conjunto com peruanos e bolivianos e estamos negociando a entrada na Guiana, na Colômbia, no Uruguai e em Angola.

 

Para finalizar, eu gostaria que o senhor falasse da sua ligação com a Universidade Federal do Acre...

Mário Pasquali - Eu tive um grande empenho aqui na criação da Universidade Federal do Acre. O Áulio Gélio [primeiro reitor da Ufac], eu conheci quando ele era diretor do Centro Universitário do Acre, que só tinha uns poucos cursos de nível superior, salvo engano Direito e Economia... Até hoje mantenho relações de amizade com o Áulio Gélio, que mora em Brasília agora. E me engajei na construção dessa universidade. Vim aqui trazendo um arquiteto do Paraná, para ver o problema da posição dos pavilhões do campus que se iria construir em seguida, em função do clima. Desço a esses detalhes pra mostrar que eu, de fato, me engajei no momento do início da construção aqui do campus universitário da universidade federal acreana e no apoio ao Áulio Gélio, que é meu amigo até hoje.