Besteirol que dá ibope

Beneilton Damasceno

Estava eu em casa de minha sogra nesta terça-feira gorda, lá pela boca da noite. Visitinha, digamos assim, sem compromisso, do tipo “ia passando e resolvi encostar”. Já me preparava para a despedida quando um discreto tilintar de pratos e o cheiro de assado de panela vindo da cozinha me fizeram retardar a partida.

Enquanto aguardava, fingindo total desinteresse, o “apelo” para me entrosar na confraria dos comensais, notei que a pequena platéia da sala acompanhava com apetite alguns lances do Big Brother Brasil, uma superprodução faraônica que o império global importou da norte-américa para fazer frente às concorrentes, que a todo momento estão pondo em xeque a hegemonia outrora quase absoluta de três décadas e meia da veneranda empresa.

Pois bem. A demora do convite à mesa me forçou a dar uma espiada no emergente programa, já que não tenho ainda essa moral toda para confiscar o controle remoto da mão de terceiros. Olha, fiquei bestificado, mas bestificado mesmo! Jamais imaginei que a televisão da minha pátria tivesse a petulância de empurrar tamanha excrescência (essa eu aprendi com o professor Dandão) goela abaixo do nosso telespectador proletário. Pouca vergonha ao quadrado!

A começar pela dupla de apresentadores, chega-se a suspeitar que a emissora do Boni e do doutor Roberto Marinho vê no seu numeroso público uma legião de mentecaptos. Isso, isso, isso! Pedro Bial e Marisa Magda Orth, com seu olhar taciturno e perguntas capciosas bem no estilo “Sai de Baixo”, são o arquétipo da insolência universal. Como sofre este povo tropical, meu Deus!

Todos os dias eu me culpo por ter vindo à luz no crepúsculo dos anos cinqüenta, razão pela qual hoje sou um renitente adversário da modernidade. Fico apoplético, por exemplo, quando escuto ou vejo pessoas, artistas principalmente, enchendo a boca na telinha para declarar, na maior cara-de-pau e perante milhões de crianças e adolescentes, que vão “comer” fulano ou beltrano (sem nenhuma conotação antropofágica, registre-se!). Isso é criminoso, minha gente! Não é excesso de puritanismo não, tenho certeza.

Tolera-se a flagrante imbecilidade dos protagonistas do Big Brother, o febeapá das patricinhas e mauricinhos incapazes de articular uma frase sem lançar mão da gíria, o vocabulário sofrível... Vá lá que seja! Só não dá para engolir por que as autoridades brasileiras, tão preocupadas com a formação moral dos infantes, permitem que atos de profunda obscenidade sejam veiculados, diariamente, num poderoso meio de comunicação como é a TV, com cenas que vão influenciar decerto na personalidade desses inocentes. Esta é a geração que o Brasil do século vinte e um está preparando. O produto será, então, o que temos testemunhado: a destruição progressiva da instituição familiar (se é que ela vale ainda alguma coisa).

Daqui a algumas semanas, o Big Brother chegará ao fim. O retumbante sucesso da peça vai levar a concorrência a inventar (entenda-se “copiar”) outra produção mais atraente, gastando menos dinheiro. E menos roupa. A réplica virá impiedosa. E por aí vai... E pensar que eu sonhei a vida inteira em completar dezoito anos só para poder assistir ao filme “Dona Flor e Seus Dois Maridos”, no Cine Acre... Dá uma raiva!