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Fabrica de dinheiro

por petrolitano publicado 31/10/2011 14h52, última modificação 31/10/2011 14h52
Jornal Pagina 20, 19/04/2001
* Raimundo F. Souza

 

Enquanto uns cidadãos terão que gastar seus neurônios para se qualificar, estudando feito condenados para disputar uma vaga para emprego através de  concurso público e, depois de empregados, trabalhar oito horas diárias para defender um mísero salário, ou ainda tocar um negócio próprio, trabalhando até a exaustão para defender a sobrevivência, alguns espertos, como os políticos, por exemplo, vão ganhando seus gordos salários, cuidando de seus negócios, brincando de defender os direitos da comunidade e ainda têm direito a outros auxílios, inclusive para paletó. Outros sortudos, que devem ter nascidos de cabeça para baixo e ao luar, conseguem manter negócios que são verdadeiras galinhas dos ovos de ouro.

Observando a conjuntura atual e pela situação sócio-econômica virgente no país, a menos que se trate de um falsário profissional, torna-se difícil acreditar que no meio da selva Amazônica alguém mantenha um negócio que pode ser comparado a uma fábrica de dinheiro. No entanto, esse negócio existe e seus proprietários fazem dinheiro vinte e quatro horas por dia durante os trezentos e sessenta dias do ano, independentemente de a meteorologia anunciar bom ou mau tempo. Esse é o que se pode chamar de negócio danado de bom.

A firma que tem a concessão das travessias em balsas dos rios da Amazônia que cruzam as rodovias é que administram esse “negócio ruim”, que só deve dar prejuízo... para os usuários das balsas, logicamente. Quem tem dinheiro atravessa seu veículo; quem não tem fica no barranco ou transforma sua condução em anfíbio. E o pagamento é feito antecipado, igual entrada de cinema. O automóvel paga seis e cinqüenta, caminhonete dez, caminhão simples vinte um e sessenta, ônibus e carretas quarenta e cinco, com variações de preço para veículos carregados e vazios.

Na BR-364, trecho Rio Branco a Porto velho, as balsas do Rio Abunã/Madeira, cruzando veículos de um lado para o outro, dia e noite, bem como outras balsas do mesmo grupo, constituem um negócio tão rentável e de arrecadação tão segura que podem ser comparados a outro negócio oficial (Detran), que também arrecada dinheiro igual aparar água na bica. No entanto, o que se pode fazer?  O Detran tem suas leis e os seus homens na rua para assegurar o cumprimento da legislação e o devido pagamento; as balsas dispõem dos equipamentos flutuantes motorizados para fazer a travessia das águas que não dá para fazer a nado e, principalmente, rebocando o carro. A única saída, então, é pagar. Como dizia o grande poeta labreense “Rafeso de Sebastiana”, usuário, contribuinte e consumidor é igual cachimbo: nasceram para levar fumo.

Sobre as balsas, se houvesse interesse por parte dos representantes políticos da Amazônia, o problema poderia perfeitamente ser resolvido. No entanto, não conhecemos nenhuma iniciativa concreta nesse sentido. Deve haver fortes interesses em manter esse negócio milionário ainda por anos a fio. Sabemos que o impedimento e a dificuldade para se construir uma ponte no Rio Madeira, por exemplo, não podem ser a extensão ou a profundidade do rio, pois existem no Brasil outras pontes bem mais extensas e em locais bem mais difíceis. O que pode estar faltando de fato é vontade política, ou então o empreendimento está esbarrando no interesse de alguém para manter o status quo. Pois causa estranheza os políticos da região não evidenciarem essa preocupação, tampouco levantarem essa bandeira em suas programações de governo.

Sobre o Departamento de Trânsito, é outro negócio de faturamento fabuloso cuja renda não é revestida em benefício dos usuários. O único direito que ele tem é de pagar sem reclamar nem atrasar.

O direito da comunidade que os políticos se dizem defender deveria passar por essas questões, ou seja, ficaríamos gratos se os representantes do povo fiscalizassem a aplicação desses recursos e ainda exigissem a prestação de conta desse órgão. Porque não existe nada mais frustrante e revoltante para o contribuinte do que pagar caro imposto, taxas, licenças, tudo dentro do prazo, sendo cobrada multa por qualquer atraso, e não receber nada em troca. E o mais estranho ainda é que não existem leis para obrigar o órgão arrecadador a oferecer melhorias para os contribuintes e prestar contas sobre a aplicação dos recursos. Ou seja, o pagamento que se efetua para o Detran é mesmo que jogar o dinheiro na cratera de um vulcão ativo: jamais alguém conseguirá recuperá-lo.

Raimundo F. Souza é bibliotecário da Universidade Federal do Acre.