Com intuito de brecar os avanços democráticos, instalou-se no País, durante longas décadas, o regime militar de extrema direita: extinguiram-se os partidos políticos; o Congresso foi fechado. Para dar aparência democrática à “coisa”, foi “permitida” a criação de dois - e apenas dois - partidos políticos. Na base de sustentação do governo, foi arrebanhado respeitável time com o que havia de mais expressivo entre as lideranças conservadoras. A Aliança Renovadora Nacional estava efetivada. Composto o time, alcançada ampla hegemonia às demais lideranças menos expressivas ou dóceis, restou alinhar-se ao time reserva, ou Movimento Democrático Brasileiro. Ora, num modelo repressor de ultradireita, era natural todos os queixumes, descontentamentos, anseios e sonhos da maioria da população desaguarem no alternativo - como a tábua para um náufrago! Ou isso, ou ser arrastado pela correnteza! Com a abertura democrática, a represa dos excluídos transborda numa enxurrada de votos e deságua no partido reserva, que, além de chegar à condição de titular, é também guindado à posição de primeiro do ranking na América Latina... do Ocidente... essas coisas que brasileiro tanto anseia e preza. Alcançado o poder político, o mostrengo viu-se em inusitada situação: havia passado tanto tempo na reserva e sendo a câmara de ressonância dos excluídos que não possuía a necessária experiência para governar. Por outro lado, era pressionado pelas necessidades de seu enorme contingente eleitoral. Forjado neste quadro, é natural que o “alternativo” tivesse, também, fundamentos conservadores, mesmo porque seus expoentes igualmente pertenciam às camadas sociais mais elevadas; só foram preteridos pelo fato de os militares já terem completado seu time. Como 20 anos de fome é muita fome, muitos dos reservas originais já tinham “pendurado as chuteiras” ou, hereditariamente, buscado sua reprodução, enquanto força política, em suas gerações mais novas, ou, à sua falta, em “agregados”. O reflexo saiu pior que o original - os “garotos” danaram-se a fazer traquinagens; os que não foram condenados têm processos a responder. Explica-se: quando assumiram, principalmente prefeituras, não tinham planos de governo; no máximo, de sobrevivência. Dentro dessa linha de raciocínio, busco estabelecer que grupos dominantes tentam se perpetuar como hegemônicos dentro de determinado sistema sócio-político-econômico. No caso acreano, já tomado como exemplo, é a meu ver indissociável. Basta observar que os mais antigos são ex-seringalistas, seus descendentes ou nomes a eles economicamente ligados. Explica-se a prevalência do econômico sobre os demais poderes pelo esgotamento do sistema de aviamento, antigo modo de acumulação capitalista. Seca a fonte extrativa, nossa elite lança-se sobre os recursos disponíveis - os públicos, como forma de manutenção enquanto grupo hegemônico e até fisicamente. A exceção nessa composição de poder é Edmundo Pinto, que vem de camadas mais populares e com idéias modernizadoras, mas, para sua desventura, é a falta dessa linhagem ou ligações mais sólidas com as tradicionais famílias seringalistas que orienta os disparos em sua direção num quarto de hotel em São Paulo. A única voz que se levanta de quando em vez é a de Pedro Veras, um aposentado do serviço público. Seus assassinos estão soltos, acobertados pela e para a coesão dos grupos tradicionais. Na esteira de precursores como Chico Mendes, D. Moacir, padres Cláudio e Destro, Raimundo Barros, Osmarino Amâncio, desponta nova tentativa progressista, personalizada por Jorge Viana. Desta vez, atendendo a todos os requisitos básicos de um candidato ao poder e, espertamente, com ligações de parentesco e político com grupos tradicionais. É esta última a característica determinante para ser aceito como liderança e candidato dos grupos mais à esquerda. Funciona, também, como uma espécie de garantia de que a este não sucederá o mesmo que a Edmundo Pinto: Viana tem um sobrenome com tradição na política acreana e está aliado a nomes de igual peso. À elite não compensa partir para o enfrentamento direto; todos os “coronéis” teriam muito a perder. O pêndulo político oscila entre a faca seringueira e a motosserra que corta árvores e amputa membros, porém o governo alcança maior êxito em sua tentativa de modernização desse pedaço esquecido de floresta, voltando-se para o atendimento das necessidades da maioria dos despossuídos - apesar da chiadeira geral de um confuso mosaico de interesses amontoado em torno do MDA. Os grupos progressistas, alicerçados em feliz combinação de teoria e experiência, ao mesmo tempo em que deslancham num frenético e avassalador conjunto de ações e obras, apresenta incomum capacidade de renovação de seus quadros, com igual poder de resolução; preocupação pouco considerada à épocas anteriores. As forças arrebanhadas sob o guarda-chuva do MDA tornam-se confusas e preocupadas por voltarem a sentar no banco de reservas, com mais gente e cobertura menor. Não dá mais para fazer pilantragens com o dinheiro público e desculpar-se alegando falta de recursos. Mudou o parâmetro - sabe-se que é possível o gerenciamento do Estado! Estão na contramão da história e envidam esforços para fazer o Acre regredir, no mínimo, 20 anos. Não querem fazer política; e sim, dividir poder! Quem quer fazer política apresenta argumentos válidos para que suas teorias sejam levadas à sério. Só que para isso é preciso deter SERIEDADE! A meu ver, cometem um erro crasso de avaliação: quanto mais atacam ao governador (é personalizado mesmo!), mais este trabalha! Sugiro que passem a elogiar, talvez o “homem” relaxe e arrefeça o ímpeto, pois no ritmo atual vão ficar comendo a poeira das estradas que estão sendo asfaltadas... E bota poeira nisso!
Professor do Departamento de Geografia da Ufac
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