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Aspectos do nosso liberalismo

por petrolitano publicado 09/11/2011 15h04, última modificação 09/11/2011 15h04
Jornal Página 20, 28.11.2001

José Cláudio Mota Porfiro


O liberalismo em essência, enquanto doutrina, jamais poderia confundir-se com receitas de ditadores arrogantes. Seria por demais paradoxal. Todavia, nós estamos no Brasil e, por aqui, as coisas são sempre contrárias ao bom senso. O conceito de liberdade para os liberais liberta apenas os ricos. Aos demais, aos esquecidos desta nação, cabe apenas pagar os impostos que mantêm uma casta de privilegiados que ditam normas a serem fielmente seguidas.

O Aurelião anota que ditadura é uma forma de governo em que todos os poderes se enfeixam nas mãos de um só indivíduo, grupo, partido ou classe. Ora,  partindo deste princípio, observa-se que o mandatário-mor do Brasil manipula  -  ou compra  -  deputados e senadores que aprovam o que ele bem quer. Do mesmo modo, mantém o judiciário em cabresto curto, haja visto o descumprimento das ordens emanadas do Supremo Tribunal de Justiça com relação ao pagamento dos professores universitários.

É exatamente o que está ocorrendo: vivemos uma ditadura suavizada por doutrinas, como o neo-liberalismo, que prega o bem estar apenas para alguns. O nosso dono do poder abusa das medidas provisórias e, como o arauto desta pobre corte, ergue a voz e diz o que deve e o que não deve ser feito. Qualquer analista pouco experimentado observa que o discurso dos governistas relativo ao problema das universidades federais tem uma feição nitidamente fascista. A questão humana fica jogada num segundo plano degradante. Senão vejamos as últimas sanções emanadas do Todo Poderoso Senhor do Planalto Central.

A medida provisória nº 10 altera a lei 8475 e contradiz princípios democráticos básicos conquistados pelos servidores públicos com muito esforço. Com relação à contratação de servidores por tempo indeterminado, para o atendimento de necessidades temporárias, a MP determina que tal procedimento deve ser adotado tendo em vista a “manutenção e normatização da prestação de serviços públicos essenciais à comunidade, quando da ausência coletiva do serviço, paralisação ou suspensão das atividades por servidores públicos, por prazo superior a dez dias, e em quantitativo limitado ao número de servidores que aderirem ao movimento”.

Ora, os professores das universidades federais, em sua totalidade, aderiram à greve. Segundo a norma, seria o caso de contratar cinqüenta ou sessenta mil substitutos. Consequentemente, a qualidade das ações docentes cairia de forma vertiginosa, em vista da pouca experiência dos novos contratados.

E mais adiante: “...os contratos poderão ser prorrogados por igual período, na hipótese da continuidade da ausência, da paralisação ou da suspensão das atividades. Tendo em vista o alongamento da greve, poderemos chegar, enfim, a um momento crucial em que os professores em greve voltarão a trabalhar e os novos contratados já terão criado vínculo empregatício. Vejamos, então, o buraco onde estamos caindo. Virá, enfim, a falência total do sistema, como querem os donos do poder.

O decreto 4010 determina que “compete ao Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão mandar processar a folha de pagamento dos servidores da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, após liberação de recursos para o respectivo pagamento, mediante expressa autorização do Presidente da República.

Estará institucionalizada, assim, a ditadura das normas empurradas goela abaixo, o que muito faz lembrar o período áureo dos Atos Institucionais da velha ditadura militar.

Para dar cunho científico a estes escritos, basta lembrar o sempre atual Karl Marx quando trata da categoria exército especial de reserva... Em síntese, nos diz o filósofo comunista: o número de desempregados e excluídos do mercado é tal que leva o patrão a considerá-los enquanto uma faixa da população, que estará sempre à sua disposição, para ocupar os cargos vagos ao custo de salários irrisórios que apenas não os permitirá morrer de fome, mas permitirá sobreviver para procriar gerações também dispostas a ganhar minimamente. Assim, se uma indústria resolve fazer greve, o patrão já tem leis que o permitem demitir os rebeldes. O exército de reserva, a baixo custo, estará sempre à disposição dos poderosos. Tanto a necessidade de ganhar o pão de cada dia, como a reivindicação por melhores salários  -  as duas coisas  -  findam por levar os empregados a ficar sempre à mercê dos patrões que os querem acovardados diante da necessidade de sobrevivência.

As universidades têm formado um número imenso de profissionais que dariam a vida por um emprego de professor universitário, com um salário de 800 ou 900 reais, para não viveram as agruras do desemprego nacional. E o patrão, assim, está à vontade para escolher entre os que querem ganhar menos e os que querem ganhar mais, sem se importar com a qualidade da ação docente. É claro que, por fim, poderão vir as demissões em massa, uma vez que fazer ciência neste país não tem dignificado nenhum intelectual das nossas universidades. Correremos o risco das demissões porque o judiciário não tem força sequer para fazer frente ao abuso de poder do Ministro da Educação.

E quem falará por nós? O número de servidores públicos federais é imenso, mas não tem representantes dignos no Congresso Nacional. As universidades, então, sequer podem contar com parlamentares eleitos com os votos de professores, técnicos e alunos. Por isto eu proponho uma frente parlamentar suprapartidária em prol do soerguimento das nossas universidades... Mais quais dos nossos parlamentares teriam coragem para ir de encontro ao que dita Fernando Henrique? Quem se arvora a tal empreitada? Quem é macho o suficiente? Eu desafio!...

claudioporfiro@zipmail.com.br