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“A justiça não é justa”

por petrolitano publicado 24/01/2012 18h37, última modificação 24/01/2012 18h37
Jornal A Gazeta, 02.02.2002

José Mastrangelo


... Nesta sociedade como a nossa, em que os ricos têm o poder e os pobres, privados dele, ficam marginalizados e excluídos. Separados conceitual e socialmente, ricos e pobres constituem classes sociais antagônicas, mantendo-se subliminarmente em pé de guerra. 

Nesta sociedade, em que 5% da população possui todos os meios de produção (terras e fábricas), são chamados de “problemas sociais” os roubos, latrocínios, assaltos, invasões de terras, greves, mobilizações populares, passeatas, pobreza, mortalidade infantil, favelas, desnutrição e doenças endêmicas. 

Nesta sociedade, em que o Estado é totalitário, sendo governado por homens impiedosos e autoritários. Está do lado e com a classe dos ricos e poderosos. 

Nesta sociedade, em que “o povo sofre quando o mais vil dos homens governa, e geme quando o ímpio domina” (Provérbios 29:2). 

Nesta sociedade, em que o poder que o Estado tem é muito grande. Persegue e elimina pessoas, quando estas não aceitam conformar-se com o Estado aí posto. 

Nesta sociedade, em que há leis de todo tipo: as tradições, as leis familiares, as leis de grupos, os regulamentos, os estatutos, as leis penais, as leis governamentais, as leis constitucionanais e as leis morais. São leis estas que servem para manter e reproduzir a sociedade como sendo essencialmente discriminatória e socialmente desigual. 

Nesta sociedade, em que as leis legalizam um Estado de direito e justificam uma ordem econômica que, estruturalmente, traz desigualdades sociais. Julgam justa essa “ordem”, porque as leis determinam e punem aqueles que não as cumprem. Sendo a Justiça poder de Estado, jamais será contra tal poder, afinal dele faz parte. 

Nesta sociedade, em que os homens da lei pouco fazem para a justiça ser “cega”. Sempre olham em direção do lado do mais forte e sentenciam “cegamente” a favor dos interesses do Estado. Se assim não fosse, os homens da lei não seriam “legais”. 

“A justiça não é justa”. 

... Quando a corrupção invade o poder da justiça, contaminando-a por dentro. Esse vírus da corrupção é mortal. Desmonta totalmente as estruturas da justiça. Quando isso ocorre, os homens da lei não têm moral para julgar. Ao perceber esse estado de coisas o povo se revolta e pede justiça com o afastamento imediato da corte dos corruptos, como o povo argentino vem fazendo indo às ruas protestar. 

Não é de se estranhar como homens da lei venham a deflorar a justiça, tornando-a desacreditada e impotente. Atribuo em parte a culpa à formação que esses homens da lei tiveram na universidade. Numa sociedade como a nossa, em que o ter vale mais do que o ser, o estudante de Direito está sendo levado a não enxergar “direito”. É formado para competir e ter uma carreira de sucesso, que lhe proporcione dividendos financeiros compensatórios. Com essa concepção na cabeça, no exercício da magistratura, em qualquer instância, o ex-estudante de Direito não terá o suporte moral para julgar, podendo corromper-se em sua sentença. 

“A justiça não é justa”. 

... Quando a justiça se move ao gosto de uma política partidária definida. Neste caso, os togados se curvam aos interesses de um grupo político, e no ato de julgar, flexibilizam as leis, distorcendo o seu sentido. É lamentável quando isso ocorre. A justiça perde sentido, abrindo espaço à manipulação. 

“A justiça não é justa”. 

... Quando a justiça não é exercida de acordo com os princípios da isenção, da independência, da imparcialidade, da impessoalidade, etc., sabendo, no entanto, que, nesta sociedade, é difícil manter-se em cima do muro. A balança penderá do lado do mais forte. 

“A justiça não é justa”. 

... Porque o povo (fraco e indefeso) sempre leva a pior. Tem apenas 2% de chance de ganhar. 

“A justiça não é justa”. 

... Nesta sociedade como a nossa, desigual, corrupta e preconceituosa. Entretanto, o sonho não acabou. São muitos que sonham com uma justiça que virá para modelar um mundo diferente. Será a vez de uma “sociedade sem justiça” .