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Como está a universidade?

por petrolitano publicado 24/01/2012 18h33, última modificação 24/01/2012 18h33
Jornal A Gazeta, 09.02.2002

José Mastrângelo

Nisso há um consenso. Nos últimos tempos, a universidade tem sofrido inúmeras tentativas para ser privatizada, para deixar de se voltar para os interesses da maioria da população e passar a atender os interesses do capital, de quem for e com ela quiser obter lucros, pois este é o objetivo de uma instituição particular.

A universidade pública tem sofrido muito nos ataques e o governo tem feito toda uma divulgação no sentido de passar para a sociedade uma imagem falsa dessa instituição, dizendo que ela é improdutiva, por exemplo, que o problema é o gerenciamento, que a relação professor-aluno é uma das mais baixas do planeta e tantas outras explicações que confundem a opinião pública e desmoralizam a comunidade acadêmica, composta pelos professores, técnico-administrativos e estudantes.

É por isso que hoje se fala em uma universidade sucateada (não tem dinheiro para comprar equipamentos, livros), numa universidade sitiada (porque tem um cerco político e uma enorme disputa para comprá-la e para tanto é preciso primeiro convencer a população de que ela está dando prejuízos) e uma universidade em ruínas.

Outros adjetivos têm sido apostos à universidade, como agredida (quando a política federal e não só ela, como no caso do Estado do Acre, nela intervém), eficiente e barata (no caso de poder sobreviver com o mínimo de recursos) e mercantilizada (vivendo sob o signo do mercado).

Entretanto, apesar de tudo isso, a universidade pública continua extremamente viva. Segundo o Instituto de Estudos Avançados da USP, a universidade tem um dos melhores índices de qualidade de ensino de graduação e pós-graduação.

De acordo com esse instituto, no Brasil as universidades públicas atendem apenas 33,5% dos 1.868.529 alunos matriculados, isto é, 625.957 alunos. Quer dizer que 67% que conseguem chegar, nesse nível de ensino, está nas instituições privadas, pagando por seus estudos. Nos Estados Unidos e na França, 99,9% e 92,08% dos alunos, respectivamente, estão nas universidades públicas.

No Brasil, o governo gasta 4,6% do PIB com educação. Contudo, aí estão incluídos os gastos com os hospitais universitários, com o pagamento dos aposentados, ou seja, com despesas que deveriam sair de outras fontes de recursos.

O orçamento de uma única universidade americana, a Harvard, para o ano de 2000 foi de 2,9 bilhões de dólares, o que corresponde à soma de seis grandes universidades brasileiras - USP, UFRJ, Unicamp, UFMG, UFF e UFPB.

Contudo, continuamos produzindo muito. As universidades públicas têm 77,2% dos docentes titulados em nível de doutor, 33% dos docentes têm tempo integral, 91,5% das publicações de docentes de pós-graduação (das 45.781) provêm das universidades públicas, que também são responsáveis por 94,75% das publicações no exterior e 81% dos cursos de mestrado e 89,2% dos cursos de doutorado são oferecidos pelas universidades públicas.

Malgrado esse cenário, as universidades públicas continuam a ser aniquiladas pelo governo. Por que elas são tão atacadas? Entre tantas respostas, ficamos com esta: porque na universidade pública se pode pensar, fazer críticas, fazer reflexão, buscar caminhos que não sejam o do mercado, e isso não agrada, isso incomoda.

Então é preciso desmoralizá-la, dizer que os professores, os técnico-administrativos e os estudantes não querem estudar, que só querem saber de fazer greve, que eles são responsáveis por ela não ser produtiva.

O modelo da universidade buscado pelas atuais políticas públicas está preocupado com a quantidade - quantos artigos foram publicados, de quantos congressos o professor (com que dinheiro?) participou... A qualidade não conta muito nessa universidade funcional-operacional, terceirizada, da qual fala Marilena Chauí. O que vale é o custo-benefício, a produtividade, a lógica do mercado (vende?) e não a reflexão, a análise, a crítica, a produção de idéias e não só mercadorias, idéias que permitam refletir sobre esse estado opressor em que se vive, idéias que mostrem e ajudem a encontrar caminhos para sair disso. Idéias que permitam a todos ser mais livres, mais felizes.

Com a privatização e a desresponsabilização do governo com o ensino superior, é que se tem o dever de fazer a denúncia e de buscar saídas que venham a confirmar o caráter público e de qualidade da universidade brasileira.

Professor de sociologia da Ufac. Escreve neste espaço aos sábados