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É disso que o povo gosta

por petrolitano publicado 20/10/2011 12h52, última modificação 20/10/2011 12h52
Jornal A Gazeta, 24/02/2001

José Mastrangelo

Com razão. É quando o povo tem o momento de sua glória, podendo extravasar o que realmente sente e externar o seu "modus vivendi". Faz isso com alegria. Cantando. Dançando. Com imaginação. Fantasiando-se. Prestando homenagens aos seus ídolos. Criticando com humor. Ironizando. Satirizando. Apresentando-se às elites, que, de camarote, assistem à festa, entendendo em parte os recados dados sob as diversas formas.

"Carnaval: é disso que o povo gosta" quer dizer o que o povo não pode expressar durante os dias "normais" de sua vida, impedido que é de fazê-lo por força das regras que a sociedade tem, imperativas e autoritárias.

Quer dizer não ao autoritarismo, que, apresentando-se multiface, faz estragos irreparáveis à vida de todos nós e à sociedade. O autoritarismo, sobretudo aquele institucionalizado que dá ordens para serem cumpridas e penaliza quem não as cumpre, que tira a imaginação de um povo.

Esse autoritarismo se vê materializado nas relações de trabalho, na família, nos sindicatos, nos partidos políticos, nas igrejas e nos governos executivo, legislativo e judiciário. Está associado ao regime econômico que temos, que causa a maioria dos males que a sociedade sofre e condena, como, por exemplo, a violência, a prostituição, a exploração do menor, o assalto e a droga.

Quer dizer não à corrupção. Essa praga faz vítimas inocentes quando recursos públicos são desviados para vir a enricar meia dúzia de elementos, que não estão nem aí na defesa das causas do povo.

A corrupção, aquela passiva, se encontra dominando os poderes públicos, quando há intenção de favorecer os "próximos" à revelia da lei e da ética.

Quer dizer não à escravidão. Embora a escravatura como modelo tenha sido abolida, há mais de um século, ela ainda existe em nosso meio, quando alguém, querendo ser o mais, passa a abusar das pessoas. O marido pisa na mulher. O adulto explora o menor. O patrão se apropria da força do trabalhador.

Quer dizer não à discriminação, que divide as pessoas em classes sociais, segundo as raças, credos religiosos e doutrinas filosóficas. Essa discriminação vem causando conflitos, assim como, no passado, guerras sangrentas. Por exemplo, durante a segunda guerra mundial, Hitler mandou cremar milhões de hebreus pelo fato de considerá-los inferiores como raça e acreditar na raça pura, representada pelo povo germânico.

Há discriminação quando, no campo do trabalho, se diferencia o salário segundo os critérios dos gêneros masculino e feminino. Há discriminação nas escolas, quando se dividem os alunos em classes diferenciados segundo a escala dos "QI". Discrimina-se até nas igrejas, quando a salvação eterna é negociada segundo quanto se pode em R$.

"Carnaval: é disso que o povo gosta", ao dizer não, está dizendo sim aos valores que a sociedade deveria ter e cultuar. O Carnaval é a vitrine e o desfile oficial desses valores.

Se olharmos o Carnaval focalizando esse ângulo, as pessoas se sentirão mais animadas e participarão com muito mais entusiasmo de seus enredos. É quando se sentirão mais cidadãs, contribuindo, inclusive, para evidenciar a necessidade de o povo ter uma vida melhor, mais democracia, mais liberdade, mais solidariedade, mais amor, mais paz, sem mais usar fantasias, máscaras, drogas ou bebidas. Não precisará mais sair e refugiar-se num "retiro" para não ver "A banda passar".

"Carnaval: é disso que o povo gosta". Festa do povo. Não é de satanás como alguém afirma. É de todos. Ao sair para desfilar na "avenida", manifeste o que você realmente é. A máscara é só um adereço.

*José Mastrangelo é professor de Sociologia da Ufac.