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Feliz milênio novo

por petrolitano publicado 20/10/2011 11h37, última modificação 20/10/2011 11h37
Jornal Pagina 20, 08.02.2001

* Lauro Morhy

No milênio que recém findou, a humanidade progrediu em meio a guerras e frequentes retrocessos no que diz respeito às relações entre os homens. Segundo a Unesco, cerca de dez mil sociedades diferentes vivem hoje compondo duas centenas de Estados, nas quais, frequentemente, minorias hegemônicas ainda se impõem sobre maiorias indefesas e oprimidas, quebrando, assim, um importante princípio da ética universal.

A verdade é que até agora o homem não foi capaz de criar e implantar um modelo de organização social satisfatório e duradouro ao longo da história das sociedades. Idéias promissoras chegaram a ser concebidas, mas não foi possível a sua realização ou só puderam ser postas em prática parcialmente, perdendo-se depois na complexidade da problemática político-social. Idéias como as d Adam Smith e de Karl Marx, por exemplo, foram erodidas por diversos fatores, entre eles os gerados pelo próprio comportamento individualista dos homens, daqueles que querem o benefício imediato e desprezam os esforços coletivos de longo prazo que levariam a soluções amplas e duradouras para uma convivência mais harmônica. Ficam, assim, contra os seus próprios interesses e contra os da sociedade como um todo. Esse comportamento origina-se na própria falta de confiança dos homens nos sistemas em que se inserem ou em que os querem inserir.

Novo panorama obriga agora o mundo a se redefinir e a se reorganizar. Vive-se a intensificação das relações entre as nações. É a globalização acelerada. Essa globalização poderia ser mais bem recebida e aproveitada se não estivesse acompanhada de políticas hegemônicas perversas. "Mundializar" as finanças, o capital, os mercados e as empresas; substituir a cooperação pela competição dura; adaptar os sistemas produtivos à revolução tecnológica em curso, da qual muitos países estão distantes dessa revolução; liberalizar mercados nacionais em favor do mercado mundial único; desregulamentar economias nacionais em favor do "mercado livre"; privatizar até setores estratégicos da economia – nada disso contribuiu para um mundo melhor. As contradições sociais aguçaram-se e a guerra econômica instalou-se de modo mais agressivo, entre empresas, nações e blocos econômicos – haja vista o que está acontecendo agora na questão Mercosul x ALCA... Tudo isso é agravado pelo fato de o atual modelo de crescimento comprometer seriamente o meio ambiente e a própria sobrevivência da Humanidade.

É importante que nos conscientizemos, neste novo milênio, de que, justamente porque o mundo ficou mais globalizado, as desigualdades se tornaram mais evidentes e insuportáveis. É impossível aceitar, em nome da boa ética, que 86% de participação do PIB mundial estejam nas mãos dos 20% mais ricos; 13% estejam com 60% das categorias intermediárias e apenas 1%, com os 20% mais pobres ou excluídos. Acabamos de encerrar mais mil anos de guerras e precisamos fazer um grande esforço para que, doravante, prevaleça a paz. Isso não será possível em quadro tão perverso e desigual de distribuição de riquezas.

Trabalhar por uma cultura de paz e não-violência é uma excelente proposta. Isso ajuda, mas requer novo modelo de relações entre os povos e os homens. Para sermos mais realistas, admitamos que esse modelo salvador só se efetivará se as nações que controlam o globo assim o quiserem! É necessário que queiram, pois não nos parece possível conciliar o desenvolvimento auto-sustentável com as regras atuais do capitalismo internacional. Desta vez está em jogo a própria vida no planeta!

Que, neste terceiro milênio, a humanidade saiba usar as lições que a história registrou nos mil anos que findam. O conhecimento acumulado já permite resolver a maioria dos problemas existentes.

Feliz Milênio Novo! Paz, progresso e justiça para todos!

* Doutor em Biofísica Molecular e reitor da Universidade de Brasília