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Estrangeirismo na língua de Camões

por petrolitano publicado 08/11/2011 15h25, última modificação 08/11/2011 15h25
Jornal Página 20, 12.07.2001

* Raimundo F. Souza


Assim como não se pode falar de raça pura, igualmente não se pode falar em língua pura. Pode-se falar, sim, de língua mais ou menos contaminada por outras. O ingresso de estrangeirismo no nosso idioma começou há muito tempo, em Portugal, quando o mundo ainda estava muito distante de se transformar na atual aldeia global. Diariamente e inconscientemente, o povo brasileiro “speak”, “parlez”, “parla”, “habla” e fala o português nosso de cada dia. É impossível livrar-se da invasão em forma de avalancha (fr.) que inundou a nossa língua pátria, de forma original ou aportuguesada, transformando-se muitas vezes em barreira, principalmente para o povo mais humilde e menos letrado.

A priori (lat.), estamos conseguindo, pari passu (lat.), nos comunicar intra muros (lat.) e até gostando do sabor da lasanha (it.), nhoque (it.), mussarela (it.) e espaguete (it.), no entanto, pelo girar do carrossel (fr.), em breve estaremos metidos em um imbróglio (it.) a ponto de nos obrigarmos a ser alfabetizados por algum mister (ing.), se não quisermos ficar perdidos in (ing.) nosso próprio habitat (lat.) e, infelizmente, nesse aspecto, o lobby (ing.) não funciona, a saída será aprender mesmo a linguagem dessa netwoork (ing.). Pois o status (lat.) em algum setor dessa sociedade colonizada, requer o domínio das inovações tecnológicas e da língua.

Na rotina do dia-a-dia, a primeira coisa que se enfrenta é o rush (ing.) no trânsito, na hora do almoço um self-service (ing.), ou mesmo um fast food (ing.), hot dog (ing.), em algum big lunch (ing.), e após alguns minutos de relax (ing.), para aliviar o stress (ing.), volta-se ao batente até o final do expediente. Ao final da tarde pode-se curtir um happy hour (ing.). A noite pode-se curtir um hobby (ing.) através da mídia (ing.) apreciando alguns flashes (ing.) de notícia, ou mesmo alguma partida de futebol (ing.) via on line (ing.), alguns ainda preferindo se divertir jogando pôquer (ing.). Ou seja, a vidinha de classe média, mutatis mutandis (lat.), não passa desse qüiproquó (lat.) em constante feed back (ing.). E, enquanto não se consegue o recurso suficiente para aquisição de um duplex (lat.), ou mesmo um chalé (fr.) na orla marítima, apreciar os melhores shows (ing.) e curtir os prazeres que a boa condição de vida proporciona, temos que nos contentar com jacuba (acreanês) no almoço e grolado (acreanês) no jantar.

A tentativa de elaborar um texto utilizando exclusivamente termos de outros idiomas, aportuguesados ou originais, que invadiram nossa língua, não é tarefa fácil. Todavia, mutatis mutandis, procuramos chamar a atenção para o montante de aproximadamente novecentos e dez termos de outras línguas que estão incorporados ao português e pondo em risco a soberania de um idioma que é falado em sete países (Brasil, Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe). A França, por exemplo, desde 1973 que as autoridades lingüísticas francesas estão envolvidas em uma campanha maciça para manter a soberania da língua sem a interferência de outros idiomas. A Lei proíbe a utilização de palavras estrangeiras em documentos oficiais e também a utilização em emissoras de televisão, rádio, anúncios, letreiros, transporte coletivo, lugares públicos e contratos de trabalho.

O Brasil precisa acordar para o problema o mais breve possível, com providências oficiais eficazes, através de um bom ensino em todos os graus e de medidas que obriguem os meios de comunicação a usar em português correto e culto. A escola constitui-se no órgão que tem a maior responsabilidade de mudar esses hábitos e introduzir o uso do português junto a juventude. Cabe a ela, de modo especial aos professores de português, valorizar a língua, mostrar aos estudantes a importância, a beleza e a riqueza do idioma, contando, certamente, com a ajuda dos meios de comunicação de massa. Faz-se necessário criar uma comissão permanente, constituída por lingüistas e gramáticos, ligada ao Ministério da Educação, para se responsabilizar por tudo que diga respeito ao Português do Brasil – ensino da língua em todos os graus, atualização da nomenclatura gramatical, reforma ortográfica, aportuguesamento de estrangeirismos, siglas, abreviaturas etc., do contrario, o status quo (lat.) tende a se perpetuar.