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A esquerda e a globalização

por petrolitano publicado 07/11/2011 15h59, última modificação 07/11/2011 15h59
Jornal A Gazeta, 02.06.2001

*José Mastrangelo


Em todo o planeta, a esquerda moderna - que não é a de alguns partidos políticos de esquerda residentes no Estado do Acre -, está sendo impelida a uma escolha. Trata-se de uma opção que não é fácil nem simples, amplificada que está pelo processo de megablocos econômicos regionais, de que são exemplo o Mercosul, o Nafta e a União Econômica da Europa. Até porque parte dela chega a se fascinar pela idéia de que seria possível deter ou diminuir o ritmo de unificação da Europa, da América ou da Ásia.

Enquanto existem os defensores de apoio incondicional à globalização, há os que se manifestam pela manutenção de projetos nacionais específicos. Para alguns, ou a esquerda será capaz de auxiliar o crescimento das instituições e poderes supranacionais, ou a política não contará para nada. Para outros, o isolamento é a tábua de salvação dos países. Há quem defenda que, se nos isolarmos, nós apenas estaremos lidando com disputas provincianas e com a ilusão de que é possível operar fora do processo de unificação, talvez reintroduzindo velhos remédios como o apoio à criação de empregos através de aumento dos gastos e das taxas públicas. Argumentam ainda que isto era feito, alguns anos atrás, mas não funcionaria mais porque os resultados seriam aumento da inflação, maiores taxas de juros, saída do capital, o crescimento do desemprego e falência financeira.

A globalização e a inovação tecnológica abrangem uma grande revolução social que colocou em crise o mais avançado modelo de compromisso social até hoje construído no mundo - o Estado do bem-estar -, que desloca recursos numa base nacional dos lucros nos negócios para o emprego, segurança social, saúde e educação. A defesa destas conquistas, entretanto, está além do horizonte do Estado Nacional. Se a nossa resposta a esta revolução se restringisse ao nível nacional, o jogo estaria perdido imediatamente: seria com lutar contra mísseis atômicos com arcos e flechas.

Hoje, é preciso pensar numa esquerda capaz de promover um movimento em escala mundial para impor, por exemplo, uma taxa sobre a mobilidade mundial do capital. Lutar contra a globalização tem causado profunda divisão na esquerda entre os que vêem oportunidades na globalização e mudanças tecnológicas, e aqueles que só enxergam um cenário apocalíptico.

O ponto de vista pessimista é compreensível, se olharmos a globalização exclusivamente do ponto de vista do homem de meia-idade, empregado, que é protegido por seus direitos adquiridos pelo Estado do Bem-Estar Social. Como conquistas da civilização, elas pertencem a uma minoria pequena da raça humana.

A globalização, vista apenas como uma ameaça, leva a idéia de que não há opção, a não ser edificar nossas defesas e meramente resistir ao avanço da realidade. Aqui, a linha entre a defesa de nossos valores esquerdistas e a defesa dos nossos privilégios torna-se tênue.

Sem dúvida, a globalização quebra a base industrial sobre a qual os movimentos operários foram construídos, mas ela também alarga o campo de produção e mercado numa extensão nunca antes imaginada.

Em todas as partes do mundo, a globalização significa, entre outras coisas, milhões de novos empregos na indústria e melhor padrão de vida. Não há dúvida de que isto freqüentemente é acompanhado por terríveis injustiças e formas odiosas de exploração.

A globalização faz com que trabalhadores chineses ou brasileiros tenham contato aproximadamente com as mesmas tecnologias e os mesmos processos produtivos das grandes metrópoles capitalistas. Isto significa, portanto, que, em alguns anos, poder-se-á incluir, entre os países mais industrializados, o Brasil, a África do Sul ou a China.

A globalização econômica, é claro, deve ser acompanhada pela globalização de direitos, como os seus benefícios devendo ser compartilhados. No Oriente, estão sendo fundados sindicatos e as lutas dos trabalhadores estão avançando. Como no exemplo da Coréia do Sul, a afirmação dos direitos dos trabalhadores tem sido parte e parcela das reivindicações para ultrapassar a crise econômica atual. Assim, hoje estamos vivendo num período extraordinário, não previsto por aqueles que preconizavam “o fim da história”. A esquerda, como conseqüência da globalização, está experimentando uma expansão inesperada no mundo.

Pela primeira vez, é realmente concebível o encontro de uma esquerda mundial com as mudanças da globalização.

*Professor de Sociologia da Ufac