Você está aqui: Página Inicial > Notícias da UFAC > Ufac na Imprensa > Edições 2001 > Maio > Patrimônio ameaçado
conteúdo

Patrimônio ameaçado

por petrolitano publicado 01/11/2011 11h30, última modificação 01/11/2011 11h30
Jornal A Gazeta, 22.05.2001

Jerônimo Borges


Sensibilizei-me com o artigo de “A GAZETA” do último dia 17, subscrito pelas estudantes D´avila, Kleynianne e Susi, do 4o período de Enfermagem.

Triste desabafo de uma classe acadêmica, que assiste impotente uma corrida preocupante entre a educação e a catástrofe, sob o beneplácito do Ministério da Educação, que a tudo assiste passivamente. Quiçá as autoridades, nelas incluindo as da Ufac, não venham alegar que nada sabiam, que foram pegas de surpresa, a exemplo do que disse sutilmente o presidente Fernando Henrique, como a justificar a crise de energia elétrica.

O artigo sob título “Curso de Enfermagem da Ufac, o que comemorar?”, revela indiscutível afronta aos princípios legados por Florence Nightingale, que estabeleceu as bases naturais da Enfermagem, e Ana Néri, “a mãe dos brasileiros”, que aos 51 anos atuou como enfermeira voluntária e que conseguiu permissão para acompanhar seus filhos nos campos de batalha, na Guerra do Paraguai.

A melhor educação, é quando se consegue transmitir de uma geração a outra, a maior soma de sabedoria, experiência e competência. No Brasil dos últimos anos, o rumo está inverso. A começar pelos cursos públicos e particulares de Direito, que descarregam semestralmente milhares de formandos despreparados, num mercado cada vez mais exigente e competitivo.

Como não bastassem os crônicos problemas enfrentados pela sociedade brasileira ultimamente, vivemos a expectativa do tríplice desenlace de crises nas áreas da segurança e da saúde, cujo tripé esteia-se na educação.

A segurança está mais impotente, a saúde mais combalida e a educação, que é a base dessa pirâmide, mais corroída.

Qual a causa de tantos jovens despreparados a ostentar um diploma universitário? Culpa deles? Creio que não.

Os exemplos em barda emergem diariamente. Assisti, dias desses no “Show do Milhão”, do Silvio Santos, uma pergunta que qualquer universitário tem o dever de responder por simples dedução. Foi perguntado: qual desses foi escultor na França? Alain Prost, Napoleão Bonaparte, Auguste Rodin ou Jacques Cousteau. O candidato coçou o queixo e pediu ajuda aos universitários. Eles ficaram na dúvida entre Alain Prost (ex-corredor de Fórmula 1) e Jacques Cousteau (o pesquisador que esteve inclusive na Amazônia). Não sabiam, mas vão ser doutores.

Com professores mal remunerados e muitos dos quais despreparados, o declínio educacional é iminente.

De outro lado, quando na chefia do Executivo temos um presidente desacreditado (a pesquisa assim constata) vencido pelo desemprego no país e pelo agravamento de uma crise social avassaladora, a educação, a segurança e a saúde, tornam-se alvos vulneráveis.

No Legislativo, além das deselegantes “batalhas campais” a sociedade, pasma, assiste a um cinismo arrogante, desconexo com os anseios de um país que busca o crescimento, mas se vê tolhido pela insensatez, onde a tônica são os interesses políticos e personalíssimos, com respingo nocivo à educação, segurança e saúde.

Por todas essas mazelas, o maior patrimônio constitucional do brasileiro, que é a educação, fica comprometido. Sem o saber, afunila-se o leque de opções que pode fazer frente ao desemprego.

Desânimo e frustração, com raras exceções, são parte do calendário cotidiano de muitos acadêmicos, no qual, segundo relato, se inclui o curso de Enfermagem da Ufac. O sombrio panorama desenhado por aquelas corajosas universitárias, é deveras constrangedor.

Como escolas primárias que motivam a freqüência do estudante para não perder a merenda gratuita, com reflexos positivos no aproveitamento do aprendizado, as universidades têm que encontrar o caminho da motivação. Educar, também é encontrar caminhos.

A sociedade estudantil já está se cansando deste espetáculo malsão. Espaços para panos quentes, estão se exaurindo a passos geométricos.

Ainda querem criar a Faculdade de Medicina. Nada contra. Mas primeiro, que se faça a assepsia necessária no curso de Enfermagem, para um ensino digno e de suporte. Somente ao após, que se garanta ao curso de Medicina a qualidade mínima necessária de ensino.

Ao contrário, será tudo temerário. Será um pé na inteligência e outro na burrice.

Juiz de Direito aposentado

borges@brasilnet.net